sábado, 28 de março de 2015

Frente e Verso, sobre poesia e poética – Carlos Felipe Moisés

         


Por Adriane Garcia


Terminei de ler, já há um tempo, o livro Frente e Verso, sobre poesia e poética, do poeta, professor e crítico literário Carlos Felipe Moisés, edição da Confraria do Vento (2014), caprichadíssima, de um texto que reverbera.

Toda hora eu me dizendo: resenhe para o blog. Resenhe. Mas onde o tempo? Agora, finalmente, foi possível.

Não há como, ao ler esta obra e tendo o ofício de escrever, fugir de importantes reflexões. De forma leve, fluente e comunicante, Carlos Felipe Moisés, o poeta, expõe as angústias de sê-lo, as angústias do fazer poético e de tentar encontrar o conceito sobre o que seja um poeta. Tudo isso, concomitantemente refletido, enquanto o crítico também comparece com um conhecimento que só nos acrescenta.

Já em uma das epígrafes, o autor convida a pensar sobre a questão poeta profissional ou poeta amador, o ambiente/espaço de tempo em que floresce ou não a poesia, ambiente/espaço de tempo que, na maioria dos casos, é o do poeta que se  vê obrigado a trabalhar em outras profissões, a fim de obter seu sustento. “Para ganhar seu sustento, os poetas precisam escolher entre ser tradutor, professor, jornalista ou redator de publicidade e todas essas ocupações, exceto a primeira, podem ser francamente danosas para sua poesia, sendo que nem a tradução chegará a livrá-los de viver uma vida exclusivamente literária.”, eis as palavras de Auden.

Nas 224 páginas do volume, um tema ganha protagonismo: a inspiração no processo criador e o trabalho consciente, racional na feitura do poema. Além de informativo, ler Frente e Verso é um prazer, pois está recheado de histórias que o autor viveu ou sabe.  Como exemplo, uma história na qual o poeta João Cabral de Melo Neto diz para Vinicius de Moraes: “Quando surgir alguém com o seu talento e a minha disciplina, então este país terá um grande poeta”.

No decorrer da leitura, em que falam o poeta e o crítico, perceberemos que o autor não cederá aos extremos: nem um poema feito só de inspiração, nem feito sem ela, sendo puramente a parede do edifício. Poesia, portanto, dom inato e habilidade que se adquire. Trabalho necessário sobre a matéria-prima.

Contemplando aspectos vários, inclusive sobre o leitor, Carlos Felipe escreve  parágrafos imperdíveis, que aguçam a sede de ler mais poetas e de aprender mais. Frente e Verso é também um convite aos demais poetas para a elaboração racional daquilo que, no principio, é intuição.

 Deixo aqui um trecho memorável (p. 19):

O contato com a poesia implica operações extremamente complexas, que me põem em relação com um número surpreendente de graus e níveis de realidade. Ler um poema (com as devidas adaptações, valerá também para escrever um poema) significa acionar mecanismos de percepção que, de forma  mais ou menos elaborada captam os vários estratos do texto – o visual, o sonoro, o semântico, o sintático – , aos quais adere por associação ou analogia, uma quantidade de referências de ordem psicoafetiva, biográfica, histórica, geográfica etc., que todo poema, por elementar que seja, contém. E , seja no caso do leitor, seja no do poeta, é preciso atentar também no modo como tudo isso interage com o espaço em branco da página.

Enfim, um livro valioso, para poetas que não tem medo de se deparar com perguntas, com o que quer nos mexer. E mexe.


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Frente e Verso
Carlos Felipe Moisés
Crítica literária
Editora Confraria do Vento
2014