quarta-feira, 29 de abril de 2020

O mez da grippe e outros livros, de Valêncio Xavier





Por Adriane Garcia


Edição muito bonita e ilustrada, feita pela Companhia das Letras, O mez da grippe e outros livros reúne cinco obras de Valêncio Xavier: O mez da grippe, Maciste no inferno, O minotauro, O mistério da prostituta japonesa & Mimi-Nashi-Oishi e 13 mistérios + O mistério da porta aberta.

O livro, no todo, revela a inventividade do escritor Valêncio Xavier e sua linguagem de experimentação. O destaque é para o livro O mez da grippe, em que o autor escreve uma novela com diversas vozes discursivas, a partir da abordagem histórica, sobre a ocorrência da gripe espanhola no Brasil, no ano de 1918, mais especificamente na cidade de Curitiba. De forma genial, Valêncio Xavier junta recortes de jornais, notícias, fotografias, depoimentos de sobreviventes, anúncios publicitários da época para compor uma história de tragédia na saúde pública, ao mesmo tempo em que os personagens caminham para uma narrativa que envolve loucura e crime, realidade e fantasia.

O livro também assume um viés de denúncia quanto ao papel das autoridades de Estado nos momentos de pandemia, registra alguns fatos do fim da Primeira Guerra Mundial, além de recuperar o comportamento da grande imprensa, resgatando um passado que se quis esquecido; aliás, essa preocupação com o resgate do passado e com a cultura de massa em tempos idos é uma recorrência na obra do autor, podendo ser notada para além de O mez da grippe.

Valêncio Xavier é um exemplo daqueles escritores que experimentam a liberdade de criar, alargando o terreno do possível na literatura. Sua escrita é híbrida, desfazendo fronteiras entre gêneros literários e se misturando com as artes plásticas, a diagramação assumindo papel fundamental para compor aquilo que conta; sendo literatura que se utiliza de prosa e poesia, grafic novel e colagem, aproximando-se imageticamente da fotografia e do cinema (neste sentido, Maciste no inferno é um primor), enquanto entre o tecido de ilustrações utiliza-se de micronarrativas e fragmentação. Nas mãos de Valêncio Xavier, o antigo se torna novo. Sua escrita é lúdica e chama o leitor para montar um quebra-cabeças, descobrir e decifrar. Não raro, os jogos de Valêncio Xavier não têm solução – e o jogo era exatamente esse.






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O mez da grippe e outros livros
Valêncio Xavier
Cia das Letras
1998





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