terça-feira, 26 de julho de 2016

+ REALIDADES Q CANAIS DE TV - De Reuben da Rocha


Por Adriane Garcia

Era uma sexta, à tarde. Férias, em Recife, em excelente companhia. A física quântica atestaria minha atração às coisas boas, neste dia. Justamente assim, Tadeu Sarmento me passou um livro de sua estante: AS AVENTURAS DE CAVALOdADA em + REALIDADES Q CANAIS DE TV (editora Pitomba, 2013). E então comecei a lê-lo. Comecei a vê-lo:

a capa amarela, de ilustração criativa e bonita, o rato na imagem da TV, assustando como se fosse fora dela; a mulher em pé, em cima da TV, com um medo real do rato. Uma capa que já diz tanto. Dentro, o texto brincando com a forma, com os gêneros, de maneira que se indefine se lemos um conjunto de poemas, crônicas, minicontos. Fato é que em + realidades q canais de TV pensamos, rimos por vezes, surpreendemo-nos, iluminamo-nos com ideias; mas o que percebi ainda mais importante: somos convidados a olhar a cena urbana com outro olhar. Somos convidados a incluir a cena urbana na atividade da reflexão política e estética, durante toda a leitura. E de maneira densa, mas de maneira leve.

"aqueles q mijam no
espaço urbano ñ o fazem
p/ demarcar território (e
sem dúvida ñ o fazem p/
"depredar") mas sim indicar
às autoridades (q ñ andam a
pé) os locais + estratégicos
p/ a instalação de banheiros
públicos"

"o cheiro do mijo em becos
ruas, cantos de praça,
precipícios é a gestão
participativa dos anônimos
q os governos teimam em
ignorar"

Obviamente falar de um livro nunca é ler o livro, ainda mais quando o projeto gráfico (de Tazio Zambi) é parte tão integrante da obra. E é o que acontece neste livro de Reuben da Rocha. As ilustrações, pin ups reinventadas, mulheres de outros séculos (?), a própria diagramação, tudo compõe o livro de maneira coesa e completa.

Seu trabalho com a linguagem, utilizando-se de sinais gráficos matemáticos, de internet, de variação de caixa alta e baixa consegue estar atualizado, mas sem forçar, flui natural e chegamos a pensar que não poderia mesmo, neste livro, ser de outra forma. Criativo, lúcido e louco, mas sem aquela pretensão artificializada tão comum de quem ainda quer inventar a roda. Reuben é sincero. A sua linguagem faz parte desta sinceridade. É seu olhar que nos convida. É um excelente convite.

Em + Realidades q canais de TV, há temas como os pichadores, a maconha, os moradores de rua, os proscritos, os skatistas, a adolescência, as ruas, o modelo norte-americano de consumo, a televisão, a política, o amor, as mulheres, a arte e os artistas, a própria linguagem escrita e seus suportes.

adolescentes ñ “sentam
direito” pq entendem q ñ
são eles q devem se adaptar
(mas sim os assentos q têm
1função p/ dar conta) além
do + se é p/ ficar parado a
tarde inteira no msm lugar:
p q ñ deitados?”

A ÚNICA COISA PIOR Q 1GOVERNO
É 1GOVERNISTA. O POLÍTICO
CONSERVADOR PODERIA SE INSPIRAR
NO ARTISTA CONSERVADOR E AO
MENOS SE TORNAR INOFENSIVO.
LEGALIZE O SOL ANTES
DAS SEIS

A minha alegria tripla? 1. Conhecer o livro. 2. Ler o livro. 3. Ter que reler o livro pra escrever sobre ele.

Obrigada, Reuben.

P.S.: após a leitura desta minha impressão, Tadeu Sarmento completa: " Reuben da Rocha (o herdeiro direto mais jovem de Valêncio Xavier e Marcel Duchamp): escritor, poeta, compositor, tradutor e editor de revistas e sites de terrorismo cultural, cujo único intuito é instalar a gráfica na borracharia para dinamitar todos os signos da “alta cultura” a partir dos detritos que a civilização descarta depois que o preço os abandona (com o abraço fraterno de Walter Benjamin)."

Agora sim.



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