sábado, 19 de janeiro de 2019

Exercícios de fixação, de Antônio LaCarne




“Para que então ter um corpo se é preciso mantê-lo trancado num estojo,
 como um violino muito raro?”
 (Katherine Mansfield, em Bliss)


Por Adriane Garcia


O livro Exercícios de fixação (Publisher Editora), de Antônio LaCarne, é composto por dezessete contos. No primeiro deles, Cair demais, o narrador cita Katherinne Mansfield, mais especificamente seus personagens Bertha Young e Srta. Brill. Chamam a atenção as duas personagens citadas porque os temas que aparecem nesses contos de Mansfield (Bliss e Mrs. Brill), são os que atravessam não só o primeiro conto de LaCarne, como os demais de alguma forma. Com Bertha Young critica-se a ordem estabelecida, expõe-se o desejo que arde, cujo êxtase transborda amor e erotismo, mas tudo é mudez e nada se realiza. Com Srta. Brill, penetra-se na solidão, na inadequação e na invisibilidade que ela sente e só ao leitor comunica. Assim como Mansfield, LaCarne conhece o monólogo interior de seus personagens.

Jorginho (Cair demais) é o jovem que, indo a uma festa, sem franca vontade, se vê às voltas com seu “precipício existencial de dúvidas”. A vida lhe parece sem sentido, a “caçada” lhe parece sem sentido, assim como o sexo pago, do qual acaba por se arrepender. A solidão acompanhada é a presença constante e o personagem se debate entre ser ele mesmo e fazer o jogo social. Por fim, um evento inusitado mostra a Jorginho que o homem que ele deseja e de quem sente inveja pode também ter o seu próprio “precipício existencial de dúvidas”.

Em Shangai não me espera o personagem chamado “O príncipe selvagem” antagoniza a alcunha com seu modo de vida, nada selvagem, tão domesticado; LaCarne, com fina ironia, revela as vidas monótonas enquanto não decidem realizar seus desejos. Tal monotonia é quebrada pelo narrador em primeira pessoa de “Enquanto eu lia Balzac”, já que as contingências da vida, a “troca de olhares que me impediu o sono e a leitura dos meus romances policiais favoritos”, modificam ao menos os estados de espírito. É então que chegamos a Arlete no vazio.

Arlete no vazio é um dos pontos mais altos deste Exercícios de fixação; talvez porque neste conto o livro encontre a confluência do conjunto. A mulher velha, cujo tempo passou sem que se desse conta e que, agora, tarde demais, deseja o cumprimento impossível. Arlete é, sozinha, um poço de lembranças. Cuida da rotina diária como quem cumpre um calendário de condenação, pois a vida sem amor é sempre condenação, e ainda há um corpo vivo. LaCarne dá a Arlete uma complexidade riquíssima, o que torna sua verossimilhança assustadora. A imagem de uma mulher que se dedica à casa (fuga) como um cachalote em seu mar é poderosa, e o conto se realiza em beleza e potência.

Em A aranha, LaCarne explora sua capacidade de nos levar ao inusitado. Um casal está na cama transando, enquanto uma caranguejeira talvez trame um ataque. De parágrafo em parágrafo, LaCarne surpreende o leitor. O leitor tece um caminho que é logo traído, e assim até o ótimo final. Em seguida, o livro apresenta O homem de Higienópolis, conto engraçadíssimo porque a reiteração do narrador de que aquele fato não aconteceu consigo, mas com seu personagem, leva o leitor à desconfiança de que foi sim o narrador que levou o garoto de programa para o banco traseiro do carro. Finalização também inusitada.

Em Os gatos, LaCarne presta sua homenagem a estes seres sempre dignos de homenagens, e explica bem o porquê. À pureza e sinceridade dos gatos, o autor opõe o desajuste e a falsidade humana. Já em Boneca come-come, o personagem, aparentemente homem acima de qualquer suspeita, decide se comprará ou não um raticida para matar uma pessoa, um segredo que esconde outro.

No Encanadores não desentopem enganos, o protagonista e o encanador se entregam ao sexo e ao amor possível, ali mesmo, sem aviso prévio e sem referências, a paixão no escuro. Neste conto, LaCarne usa recursos de prosa poética, metáforas que tornam o texto muito bonito e tocante, conseguindo ampliar o sentimento de solidão dos personagens, mas vou abrir um parágrafo específico para o conto Lápis de cor:

O título Lápis de cor é mais um exemplo de como LaCarne sabe “trair” o leitor. Espere que lápis de cor evoque tudo o que lhe evoca e, certamente, será traído. Aqui, LaCarne conta a história de Guto, o menino de sete anos que sofria calado na escola. “Criança viada”, bolsista filho de mãe empregada doméstica, Guto passou pela crueldade do preconceito de classe e da homofobia, juntos. O conto, além de revelar características abjetas de nossa sociedade nos leva a uma empatia imediata com Guto, fazendo com que o leitor compreenda sua drástica medida de defesa.

Em Dias de promoção, um homem se pega a pensar alto na seção de hortaliças e legumes de um supermercado. Sua frase “onde estão os pepinos?” desencadeia a reação de um garoto e a reflexão do protagonista. A pergunta seria notada se quem a fizesse não estivesse na contramão da normatização tradicional dos gêneros? O garoto teria notado se para ele também a situação não estivesse sob o estigma de uma sociedade homofóbica? Em um conto pequeno, simples, de algo cotidiano numa terça-feira e, a princípio, sem qualquer importância, LaCarne consegue mostrar o que “paira no ar” todos os dias.

No conto A baleia, mais um personagem tocado pela invisibilidade. O encontro com a baleia, encalhada na praia, funciona como uma epifania, em que a vida e a morte do protagonista se confundem com a vida e a morte da baleia. Dizem os que quase morreram que nossa existência nos passa como um filme nos últimos minutos. Essa é a experiência do protagonista que, imiscuído na possível morte do cetáceo, olho no olho, se revê em infância e abismo.

Em Extraterrestres, o autor trabalha também outra recorrência: a de que não há sinceridade, a de que o mundo é de convenções e falseamentos das vontades. “Só os extraterrestres são sinceros”, ele avisa, e constrói um conto em que um homem, com um sorvete na mão, aguarda o outro que não vem. Enquanto espera aquele que “não reinventará o desejo de compensar o atraso com um abraço extra, um sorriso extra, um pau duro extra”, repara todo o ambiente e as pessoas ao redor, e essa observação se mistura aos seus sentimentos, fazendo do que era relato realista uma metáfora do mundo interior.

Ocultismo é mais um conto com um humor melancólico delicioso. O narrador tenta escrever uma história que envolve magia e comunica isso ao seu interlocutor, mas acaba desistindo e pedindo conselhos sobre sua vida amorosa cujo estado chama de “solteirice alarmante”. Estrabismo alucinante, o conto na sequência, traz um personagem que agora começa, felizmente, a aparecer mais amiúde na literatura do país, mas que é tão comum na vida real. Os homens casados, os chamados “homens de bem” acima de qualquer suspeita, que praticam sua homossexualidade às escondidas. LaCarne narra com grande sensibilidade essa história de amor em que um homem pergunta ao outro “Você quer mais?” e é tudo que se quer, mas no reino do impossível. Um conto lindíssimo em que a insistência na frase “Forcei todas as barras possíveis” consegue o efeito de penetrar no urgente desejo de amor do narrador.

Em Crise de insônia, a morte de um amigo e a prisão de outro desencadeiam um estado de torpor no narrador: “Eu queria algum acontecimento sem urgência, algo de que eu pudesse tomar conta sem insônia”. O conto mostra a dificuldade de se relacionar com um mundo cheio de vicissitudes e o papel da rotina como amortecedor de tragédias pessoais.

No último conto do livro, Pênis gigantesco, um morador de rua exibe orgulhoso seu pênis gigantesco, seu único e valioso bem. A vizinhança já parecendo acostumada, ou mesmo admirada de poder ter tal monumento pelos arredores, deixa o mendigo por ali, oferecendo até comida. Porém, num determinado momento, ele é denunciado à polícia por uma mulher. É interessante que LaCarne está menos preocupado com o fato do que com a motivação. Aqui, mais uma vez, a luz é lançada para fazer suspeitar das motivações.

Exercícios de fixação é um livro em que os personagens, na sua maioria, estão fora da heteronormatividade. Para além da denúncia de uma sociedade hipócrita e que promove muito sofrimento via preconceito, os contos de LaCarne trazem os temas universais do amor, da solidão, do deslocamento, da morte e da liberdade. Seus personagens estão na experiência da incompletude, como se pedissem um tanto de compreensão. Essa que, no fundo, todos nós pedimos. Há um destaque para a libertação do corpo, esse primeiro lugar de poder, negado desde cedo. Mesmo não alcançando a plenitude de seus desejos amorosos, os corpos, nos contos de LaCarne experimentam, buscam a reiterada sinceridade.

Se os exercícios de fixação são aqueles que nos fazem aprender, pela repetição, uma lição, LaCarne acerta bem no título, sem ser em nada repetitivo. É a vida que está, reiteradamente, dizendo algo aos seus personagens. Seus personagens estão, reiteradamente, dizendo algo para nós. Nada deveria ser tão caro, tão inacessível: “A vida em si poderia estar em promoção”.



Ele (que não sou eu) percorria o centro da cidade de madrugada em busca de rapazes que pudessem satisfazer o seu desejo. Cada quarteirão era delimitado: havia as esquinas das travestis e as esquinas dos garotos de programa. Mas ele (que não sou eu) dirigia seu carro lentamente, numa caçada, muitas vezes andando em círculos, em busca do rapaz ideal. Nem sempre ele (que não sou eu) explorava o prazer da noite sozinho, tinha um casal de amigos como cúmplices. Ao abordarem os rapazes, ele (que não sou eu) tomava a iniciativa de perguntar o preço, o tamanho e se poderiam exibir o que existia dentro de suas cuecas. O casal de amigos permanecia em silêncio, talvez controlando o desejo, observando discretamente se alguém ao redor se aproximava, pois a cidade era perigosa. Porém, ele (que não sou eu) nunca se decidia por nenhum rapaz, apenas se contentava em vê-los sem roupa por alguns segundos, desesperados por dinheiro. Muitos recusavam qualquer amostra grátis de suas qualidades específicas, pois exigiam algum pagamento prévio. Então uma bela noite, ele (que não sou eu) abordou um homem por volta dos trinta anos que dizia ser de Higienópolis. A maneira como ele falava e a ênfase na informação desnecessária porventura evidenciaria isso, mas o interessante era que a voz daquele homem era extremamente sexy. E ele (que não sou eu) convidou o homem de Higienópolis para o banco de trás. Quem dirigia o carro era o casal de amigos, um no volante e outro no banco do passageiro. No banco de trás o homem de Higienópolis tirou a camisa, baixou a bermuda de nylon e se deixou ser manipulado ali mesmo. Mas ele (que não sou eu) antes de atingir o êxtase, lembrou que durante toda a sua vida havia esperado por um grande amor, independentemente de qualquer dote físico, e que aquilo era um exemplo gigantesco de hipocrisia íntima. O programa foi encerrado ali mesmo, e o rapaz de Higienópolis saiu alegre e satisfeito ao receber uma nota de vinte reais de um otário (que não sou eu) por menos de três minutos de trabalho.”
(O homem de Higienópolis, p. 35/36)


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Exercícios de fixação
Antônio LaCarne
Contos
Publisher Editora
2018

sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

Mauricéa, de Adrienne Myrtes





Por Adriane Garcia

Vão nos deixar bordar pássaros
Nas bandeiras da pátria livre?
Pedro Lemebel

Mauricéa (ed. Edith), título do romance de Adrienne Myrtes, faz referência à Cidade Maurícia e a Maurício de Nassau, à época da invasão holandesa; é também o nome escolhido por Omar, quando decide assumir a transgeneridade.

Diferente dos demais, deslocado, identificado, desde a infância, com o gênero feminino, Omar, quando nos narra em primeira pessoa sua vida, já é uma velha e  está, como nos diz, na melhor idade: “melhor idade para morrer”, “melhor idade para ir pro asilo”, “melhor idade para ter Alzheimer”, “melhor idade para brincar no Parkinson”. É com humor melancólico, alguma nostalgia e constatações de muita dureza que Mauricéa conta sua vida. A vida de uma sobrevivente, em um país com um dos mais altos níveis de homofobia do mundo, onde a expectativa de vida das travestis não chega aos 40 anos.

A história nos chega enquanto Mauricéa está de cama, na casa que divide com duas amigas, Izildinha e Paula Klee. Está imobilizada, devido às sequelas de um traumatismo craniano que sofreu, quando foi surrada por uma gangue de, acredite, outros velhos. É interessante que Adrienne Myrtes tenha escolhido para os criminosos a idade da velhice, revelando uma continuidade: o que, a princípio, soa inusual para uma gangue de caçada a pessoas LGBT, logo nos leva a refletir sua atualidade. Há pouco, na própria realidade brasileira, um senhor de 63 anos, ocupante de cadeira legislativa e concorrendo à Presidência da República, vociferava em vídeos de redes sociais e programas de televisão seu preconceito contra gays. Os problemas não resolvidos com a sexualidade duram o ódio de uma vida inteira, velhos capazes de espancar o que julgam ser um homem vestido de mulher podem estar na fila do posto de saúde. E estavam.

Sendo amparada e cuidada por Izildinha, cuja bondade e caridade chegam a irritar Mauricéa, “quem faz caridade oprime sorrindo”, ela rememora toda a sua trajetória. O leitor se instala no pensamento da protagonista. Dali, é possível saber quais foram seus caminhos, seja em Recife, onde, órfã, foi criada pela tia e trabalhou no Chanteclair, ou São Paulo, para onde foi tentar ser uma estrela, uma grande artista, se revelar no feminino. Porém, a realidade fez o que costuma fazer com os transgêneros, empurrou-a, mais uma vez, para a prostituição. Para complementar a renda, Mauricéa foi também manicure.

Passando por grandes amores, Jonas, Gilmar, Romero, Mauricéa nos conduz à sua vida amorosa, o amor terminando ora em traição, ora em morte, “o amor não é saudável nem compreensível”. “Mona é bicho que gosta de se iludir”. É no amor que a vida mais se confunde, pois não há uma educação amorosa e, no caso de Mauricéa, o preconceito social determina muitos abandonos; não se ensina em lugar algum o amor, essa “coisa” que todos buscam e em nome do qual se pratica tudo quanto é desamor.

De maneira fluente, verossímil, suspensa de julgamento, íntima, Adrienne Myrtes consegue estabelecer uma conexão perfeita entre sua protagonista e o leitor. A naturalidade com que as lembranças surgem é notada, inclusive, nos “ganchos” de memória. De modo recorrente, uma palavra do parágrafo acima é o que desencadeia a memória que virá no parágrafo seguinte, ou de uma linha para outra: “E o que eu mais queria era ver a segurança familiar dizimada, se eu pudesse espatifava a dele pra começo de papo, atirava no coração dela, a tirava de circulação...”, “ele foi fraco, homem é assim mesmo, tem necessidades. Não havia necessidade era de você nascer na família”.

Enquanto acompanhamos a existência de Mauricéa, aparece-nos o país de fundo, a época da ditatura militar, na qual Mauricéa passa parte de sua juventude e vida adulta. A eterna tentativa hipócrita e higienista da sociedade brasileira de “limpar” as ruas dos “indesejáveis”. A direita e a extrema-direita usando do bullying aos grupos de extermínio e a denúncia de Mauricéa de que até entre os subversivos (a esquerda) ela era uma subversiva, pois nem ali os travestis encontravam apoio para os seus corpos.

“... Tempos de maremoto, de força policial específica, embora não oficial, treinada para limpar as ruas da imundície que representávamos: o esquadrão antibichas era conhecido e temido; por sua vez temiam e, por isso, paravam o ataque quando começávamos a nos cortar. Guardavam medo do mal anunciado veladamente. Naquela noite, além de me deixarem a cara inchada de porrada, fui obrigada a engolir a porra de quatro deles; conseguiram me tomar a gilete quando me caçaram. Aqui se misturam em mim a dor da humilhação revisitada e a ternura do encontro com Gilmar, meu salvador, meu querubim.”

Mauricéa, contrariando prognósticos, chega à velhice, e a homofobia acompanha a história. É na contemporaneidade, na suposta democracia, que ela é abatida, como se humana não fosse. Na narração das lembranças de Mauricéa, poderíamos supor que ela frisa apenas seu lugar (ou não-lugar) social, mas não, o grande mérito de Adrienne Myrtes é nos dar uma personagem que faz isso, mas, antes, é uma vida humana completa e complexa, com dores, alegrias, desejos, sentimentos de vingança, pontos de vista pessoais, reflexões que independem de gênero, orientação sexual, rótulo. Parte da raiva dos “quadrados” é não conseguir “encaixar” as variantes da sexualidade, achando que, mais seguro, é o mundo conhecido, que mata.  A sexualidade de Omar/Mauricéa também não pode ser totalmente compreendida (ou encaixada), pois pertence ao campo da liberdade, ao delicioso campo do “fluir”. Mauricéa é gente, que acerta e erra. Gente que aprendeu a construir distâncias, que sabe que o tempo é “esse gigolô que nos fode e nos vende em troca de momentos(...). Gente que, como toda gente, quer amar e ser amada. E, parafraseando Mario Quintana, todas as histórias são mesmo de amor.

Omar, meu amor, você está acordado? É hora dos exercícios e da massagem nas pernas, o médico falou pra não descuidar, e você tem ficado tempo demais deitado, precisa se mexer.
A única coisa que mexi de modo involuntário foi o peito. As mãos de Izildinha aqueceram minhas pernas, as palmas esfregando a pele. Meus músculos, tocados, libertaram soluços velhos, coisas guardadas. Cobri o rosto com o braço a ver se escapava da piedade, mas, igual a um filhote de cão quando sonha, deixei escapar pequenos ruídos, gemidos de choro contido; um vira-lata sem dono aprendendo a lei da rua, do asfalto. Minha mãe precisou conhecer as ruas, pode-se dizer que sua vida foi mais fácil? Mais fácil foi aceitar que o calor das mãos de Izildinha massageando minhas pernas  e pés surtiram o efeito de acalmar a alma, pacificaram a guerra em meu peito, mas acordaram involuntariamente meu pau, adormecido e abandonado entre as pernas havia tanto tempo, rebaixado à tarefa de expelir urina feito fosse outra vez criança, meu velho amigo alquebrado pela jornada; sobreviveu ao mata-pombos e a minha condição de fêmea para chegar até aqui e ser trazido de volta à vida pelas mãos de uma mulher. Fechei os olhos e me permiti sonhar com o amor, esse belo desconhecido, enquanto Izildinha me acarinhava e me lembrava: a vida é maior que a dor e tem o costume de impor sua presença. Izildinha tem a manha do negócio, é profissional.
Omar, meu filho, relaxe. Veja se dorme. Vou ao banheiro lavar a boca.

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Mauricéa
Adrienne Myrtes
Ed. Edith
Romance
2018






quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

Por cima do mar, de Deborah Dornellas




Por Adriane Garcia


Por cima do mar (ed. Patuá), de Deborah Dornellas, conta a história de Vitalina da Conceição Brasil, mulher negra, historiadora, professora da UNB, filha de pai cearense e mãe mineira, nascida em Brasília quando da construção da capital do país. Na infância, moradora em uma favela no Distrito Federal, logo se muda juntamente com a família para a Ceilândia, cidade satélite.

Indo e vindo em memórias, a protagonista, depois tornada Lígia Vitalina por uma ousadia da mãe, reconstrói a própria história e, nesse percurso, leva o leitor a muitos lugares. É em Benguela, Angola, que a narrativa começa. Fazendo o caminho contrário da diáspora africana, Lígia Vitalina busca as suas origens e, na África, reconhece as mulheres que lhe antecederam. Por cima do mar é tecido de muitas delas, são as mulheres que vão compondo o mundo neste romance.

Ao oferecer ao leitor a história de Lígia, Deborah Dornellas mostra também uma parte importante da história do Brasil, a dos candangos, migrantes que, vindos de vários lugares do país a partir de 1957, dispuseram-se a construir Brasília, sob condições precárias de trabalho e moradia. A capital não é feita para abrigar a classe de trabalhadores que a construiu. Pronta, aqueles que não podem estar dentro do Projeto Piloto são empurrados para as cidades distantes, sem serviços públicos adequados e sob forte repressão policial.

Também é destacável que a autora, a partir do personagem José Augusto Luacute, nos dá um panorama da Guerra Civil em Angola, só terminada em 2002. É comovente a história do jovem, único filho homem, que é enviado pela mãe ao exterior para que não lutasse na guerra fratricida. Luacute parte em um cargueiro holandês, mas não sem culpa por abandonar os seus. À ação de amor e desapego da mãe, Luacute deve a instrução intelectual e a vida.

Compreendendo, diariamente, e não sem dor, a diferenciação entre brancos e negros, ricos e pobres, homens e mulheres, patroas e empregadas domésticas, Lígia Vitalina busca o seu lugar – a despeito do que lhe deram – nas relações pessoais e sociais. Deborah Dornellas, neste Por cima do mar, leva-nos na companhia de uma personagem de muita beleza e luta. Uma história atravessada pelo racismo, pela misoginia (com um de seus eventos culminantes: o estupro), pela inadequação e invisibilidade social.

Um dia, em 1986, na Ceilândia, jovens reunidos para dançar em um baile black, no Quarentão, foram cercados por viaturas e um policial gritou: “branco sai, preto fica!” Em seguida, começaram a atirar. É importante lembrar. É importante não deixar esquecer. Por cima do mar é um livro que sabe que Minas Gerais e seus pretos, que Paracatu e seu congado, que Brasília e seus candangos, que Angola e suas zungueiras, que o Rio de Janeiro e o Mercado do Valongo falam da mesma dor e da mesma resistência.


Nunca achei que fosse o tipo de pessoa que faria terapia. Pensava que jamais ficaria confortável com isso. Não porque achasse que é coisa de gente doida, mas porque achava que terapia não era coisa para gente pobre. Que uma coisa não combinava com a outra. Era refém dessa crença inútil, reforçada por preconceito e desconhecimento. E, mesmo quando fui à primeira sessão, caminhei até o consultório da psicóloga carregando uma tonelada de culpa no lombo. É gastar dinheiro à toa, bobagem, frescura de branco, coisa de rico. Escutei essas expressões sei lá quantas vezes ao longo da vida. Inclusive da boca de gente da minha família. Mas aprendi a impedir que essa ideia me entrasse ainda mais pelos poros e circulasse nas minhas veias. Tenho, sim, o direito de buscar ajuda profissional que me auxilie a lidar comigo mesma e com meus problemas. Todo ser vivente tem. E de pagar uma terapia, mesmo que com sacrifício, se achar que é o caso. Era.
Sobrevive entre as mulheres negras a ideia de que, por ser preta e de origem pobre, uma mulher tem que ser sempre forte e aguentar tudo, sem sucumbir. E sem pedir ajuda. Minha mãe nunca me disse isso com todas as letras, mas sempre agiu como se esse comportamento estivesse subentendido. De tia Maria, ouvi absurdos a esse respeito. Minha tia não segurava palavra. Era uma tagarela para os padrões mineiros. Mas mãe e tia não foram as únicas que me incutiram essa crença estúpida, da qual elas próprias devem ter sido vítimas a vida toda. Vi e ouvi muitas vezes mulheres e homens negros, no espaço familiar, na vizinhança, nas rodas de amigos, falando e agindo como se para nós, pessoas negras, não houvesse a possibilidade da fragilidade.
Passei anos da minha vida guardando dentro de mim todos os detalhes do ataque. Aqueles escrotos me violaram o corpo e a alma naquele dia. Parte de mim ficou no chão seco do cerrado. Mas ainda estou aqui. E decidi não mais dar aos monstros o poder de me roubarem o gosto pela vida.
Antes de começar a falar, na primeira sessão de terapia, captei nos olhos de Míriam, a terapeuta, uma profunda empatia. Confiei nela e falei tudo que consegui em uma hora e pouco. Agradeci mil vezes por estar ali e por conseguir falar. Foi a primeira vez que mencionei a palavra feia sem constrangimento. Estupro. Estupro. Estupro. O que sofri foi um duplo estupro. Hoje se diz gang rape ou coisa parecida.
Míriam era a terceira pessoa que ficava sabendo do estupro. Além dela, até então, apenas o professor João Luís e Docas sabiam. Foram os dois, inclusive, que, cada um no seu front, me convenceram a procurar ajuda psicológica.
Um alívio conseguir falar da violência que meu corpo sofreu sem medir as palavras. A ferida ainda dói, mas já não sangra.” ( p. 169/170)

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Por cima do mar
Deborah Dornellas
Ed. Patuá
Romance
2018

Canção sem palavras, de Laura Cohen Rabelo




Por Adriane Garcia


Maria Tereza, protagonista de Canção sem palavras (ed. Scriptum), mais novo romance de Laura Cohen Rabelo, é uma musicista, violonista, filha de um famoso e requisitado luthier. Tendo vivido no universo da música desde seu nascimento, Maria Tereza se torna uma virtuose do violão. A narrativa se concentra especialmente no período de estudos universitários de Maria Tereza, na Escola de Música em Belo Horizonte – quando já fazia concertos em um duo de cordas, com o namorado Arie – e no primeiro ano após a formatura.

Dos conflitos e angústias comuns aos jovens assim que deixam a faculdade, Laura Cohen dá atenção especial à questão da vocação e da escolha de um projeto de vida. Tanto Arie quanto Maria Tereza entrarão em uma crise que coloca em dúvida não só o lugar que a música ocupa em suas vidas, quanto o lugar deles próprios na relação amorosa. É nesta crise que surgirá a viagem. Tanto Maria Tereza quanto Arie são filhos de mães judias e têm a possibilidade de fazer o “birthrigth”, um programa de turismo educativo para fortalecer a identidade judaica e colocar em contato jovens judeus de todo o mundo com os israelenses.

Ao partir para Israel, em um grupo de quarenta jovens, Maria Tereza empreenderá uma viagem surpreendente e – aqui o grande mérito de Laura Cohen – o leitor irá junto.

Chama a atenção em Canção sem palavras a fluidez do texto e a forma quase matemática (como a música) em que a narrativa vai se dando. Há um ritmo de imersão  para o leitor. Nada é dado de mais ou de menos, a leitura alcança uma verossimilhança total. Laura Cohen é profunda observadora de seus personagens, flagrando suas nuances e pensamentos. Tendo escolhido contar a história na terceira pessoa, mas no tempo verbal do presente do indicativo, Laura Cohen coloca seu narrador “colado” à sua protagonista, tanto que, no fim das contas, o leitor sabe que Maria Tereza existe, que pode ter passado por ela alguma vez e até lamenta não ter ido a um concerto seu.

Outro fato notável é que aqueles que não conhecem Israel ficam com a sensação de já terem ido lá, ainda que em sonho, enquanto leem o romance de Laura Cohen. Se a melhor literatura de viagem é aquela em que o leitor sente o que sente o viajante, fica próximo de outra cultura, ganha informações que pertencem a campos distintos do conhecimento, desenha em sua imaginação o cenário proposto a ponto de parecer ter pisado nesse outro território, Laura Cohen a cumpre em Canção sem palavras.

Além do universo da viagem, o romance traz dilemas intrínsecos aos músicos e aos estudantes de música. Como se já não fosse o suficiente, o leitor curioso encontrará uma espécie de “playlist” para ouvir, já que Maria Tereza em seu percurso de estudos vai nos mostrando o nome de grandes obras e compositores.

Canção sem palavras é um romance múltiplo, com personagens completos e complexos, demasiadamente humanos, procurando seu caminho no deserto. Da crítica geopolítica à condição feminina e à consciência do mito da masculinidade, do sucesso profissional ao sentimento constante de precariedade e da perecibilidade das coisas. Sutilmente, o lugar da viagem – um país jovem numa terra inóspita, que ameaça e é ameaçado – é também metáfora: “Ela tem a impressão de que tudo é frágil e vai acabar ruindo em pedaços um dia.”

O homem sem cidade ou é um deus ou é um monstro. Ela tem a impressão de que tudo é frágil e vai acabar ruindo em pedaços um dia. O que a salva dessa impressão sedutora e quase confortável de um fim violento é a rotina. Mais do que tudo, ela ama a rotina. Há os dias bons e os dias ruins, e isso ela pode controlar. Acorda, estuda, vai ao restaurante, trabalha, sai mais cedo quando tem aula de violão ou ensaio com o quarteto, volta para casa, estuda, toma um banho, lê, dorme. Sente que está avançando muito no violão, como se algum nó de aprendizado tivesse finalmente se desfeito, e agora ela gasta todo o tempo que tem para tocar tocando, e não se refestelando nas angústias em que se envolvera no Brasil depois que Arie foi embora. O que era uma promessa de ficar melhor finalmente tinha ficado melhor, e ela se lembra da melhor parte dos seus dias, o estudo, a rotina.
Anda muito a pé e pega a bicicleta do tio Jacques e pedala por todas as partes. Gosta de ver os judeus religiosos caminhando pela rua, gosta de passar entre eles, atravessá-los como o presente atravessa o passado. Os mais moços olham, às vezes sorriem como crianças tímidas. Bochechas coradas, homens puros. O sonho de toda religião é manter todos nós como crianças para sempre, sempre puros e sem erro. Vai enrolando para entrar no curso de hebraico, mas aprende aos poucos com a tia Deborah.
– Você não sabe de nada – diz a tia enquanto mexe a panela de molho de tomate.  – Seu tio Jacques brigou com seu avô não porque ele queria ir para Israel e ele não deixava. Seu tio Jacques saiu de casa porque ele é gay. Sua mãe não te conta as coisas direito, conta? (p. 192/193)




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Canção sem palavras
Laura Cohen Rabelo
Romance
Ed. Scriptum
2017






segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

Cloro, de Alexandre Vidal Porto




Por Adriane Garcia

O romance Cloro (Cia das Letras), de Alexandre Vidal Porto é narrado em primeira pessoa pelo advogado Constantino. O narrador, já falecido, não sabe bem em que lugar da eternidade se encontra. A partir de seu estado de “morto”, Constantino procura passar a vida em “revista”. Sem as amarras morais a que as convenções da sociedade obrigam, nada mais precisa ser fingido ou ocultado, afinal, mentir só faz sentido para os vivos. É então que Constantino terá coragem de contar sobre sua homossexualidade e como se deu a sua construção de homem heterossexual e homofóbico.

Como no romance anterior de Alexandre Vidal Porto, Sérgio Y. vai à América (Prêmio Paraná de Literatura, Cia das Letras), a escrita é direta e clara, o ritmo de frases curtas cadencia a narração. A inesquecível cena que revela a razão do título do livro é de um erotismo belo, fino e sutil. O interesse do leitor em Cloro é mantido do princípio ao fim; em capítulos curtos, muito bem costurados, o autor dá, aos poucos, os eventos que explicam Constantino e sua morte obscura, misteriosa para o leitor até quase o fim do livro.

É na infância que acontece a ruptura entre o que Constantino é (ser) e o que Constantino irá se tornar (estar). Um evento secreto e traumático de viés homofóbico, cometido por seu colega de escola, Marcos Bauer, traçará a linha que Constantino definirá, aos oito anos, como divisória entre a espontaneidade da criança, que simplesmente sente, e a performance limitada, do macho adulto que finge, com medo de ser descoberto.

A partir dos oito anos, Constantino estará na vida como quem está permanentemente num palco, atuando, sem descanso, para não ser pego em flagrante. Na rota de fuga, todo o aparelhamento do homem hétero bem-sucedido, uma espécie de kit-homem-de-bem: sucesso profissional, casamento, família, aceitação social e bastante afirmação de masculinidade, com pitadas de homofobia: “Nunca hostilizei ninguém cara a cara. Não me considerava homofóbico, mas participava de piadas e levantava suspeitas condenatórias contra possíveis homossexuais. Acho que devo ter vergonha disso, você concorda?” Obviamente, o que este narrador nos traz é uma vida triste, premida pelos ditames do patriarcado, camuflada, que envolve filhos e amores não vividos. Ser infeliz é também fazer infeliz.

Um segundo evento traumático, agora na vida adulta de Constantino, causará uma reviravolta, quando ele começará a fazer um raio-X de suas relações e um princípio de mudança.

Cloro é um livro interessantíssimo e corajoso, que traz um personagem crucial para a nossa reflexão, aquele que, impedido de ser e exercer a sua sexualidade, participa de um mundo triste, de tanta violência e engano. A negação e a dor de Constantino oferecem o retrato de uma sociedade que prefere enrustir e anular, quando a vida é curta e talvez não haja tempo para ser feliz, se gastamos todas as horas com o que esperam de nós. Haverá tempo para alguma realização sexual e amorosa genuína de Constantino? O leitor torce por ele, mas o autor, assim como as vidas mal vividas, é impiedoso.


Os avós de Débora haviam sido pioneiros no Jardim Virgínia, no Guarujá, e tinham uma casa grande na esquina da avenida Atlântica com a rua do canal. Durante nosso namoro, passamos vários feriados nessa casa.
Quando isso acontecia, eu dividia quarto com o meu cunhado Sílvio, irmão único e mais velho de Débora. Esse quarto que ocupávamos – “o quarto dos rapazes” – era na verdade uma garagem convertida em dormitório adicional. Ficava separado da casa, do lado de fora, com acesso independente.
O quarto tinha dois beliches de madeira, uma cômoda e um pequeno armário perto do banheiro com azulejos azul-celeste e um chuveiro elétrico que sempre dava defeito.
Sílvio era cinco anos mais velho do que eu. Na época em que dividíamos o quarto mais frequentemente, ele começava a explorar sua vida adulta. Dirigia, bebia, saía à noite. Nem Débora nem eu ocupávamos muito de sua atenção. Ele não era rude, mas pouco falava conosco. Tinha coisas mais importantes para fazer.
Sílvio e Débora acabaram ficando muito mais próximos ao longo dos anos, sobretudo depois da doença dos pais. Já eu nunca consegui desenvolver uma relação espontânea ou íntima com o meu cunhado.
A culpa terá sido minha, porque acho que não desenvolvi relação íntima ou espontânea com ninguém. É difícil ser espontâneo quando se tem medo. Como ser íntimo quando a intimidade é o que mais apavora você?” (p. 33/34)

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Cloro
Alexandre Vidal Porto
Cia das Letras
Romance
2018










quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

Mulherzinhas, de Louisa May Alcott





Por Adriane Garcia

Terminei de ler essa belezura que é Mulherzinhas, de Louisa May Alcott, publicado pela primeira vez em 1868.

O romance retrata a vida de uma família durante a Guerra Civil Americana, quando o pai está na guerra e mãe e filhas têm que continuar a rotina, após perderem grande parte de seus bens. A solidariedade é destacada como valor comunitário essencial.

A história se centra nas quatro irmãs, Meg, Jô, Beth e Amy e conta de modo fluido e divertido o mundo de infância e adolescência que é construído à custa das dificuldades e da imaginação. Louisa May Alcott dá uma aula de construção de diálogos. Também reserva um papel importante para o vizinho Laurie, jovem solitário que encontra nas vizinhas a amizade e uma segunda família.

É interessante como cada irmã tem sua personalidade bem construída o que as torna verossímeis e reais, com destaque para Jô, uma menina de 15 anos que não quer ser uma menina nem se comportar como uma mulherzinha. Jô, que protagoniza a história, tem como melhor amigo um rapaz e quer se tornar independente e escritora, ao invés de casar-se. 

O livro foi o primeiro a tratar de uma personagem adolescente desta forma.

Mary May Alcott foi uma escritora à frente do seu tempo. Não se casou, ganhou dinheiro com literatura para sustentar sua família (tendo antes passado por diversos empregos, de governanta a lavadeira de roupas), foi abolicionista e sufragista.

Um clássico que vale a pena conhecer.


“– Meninas, não briguem – Meg repreendeu-as. – Vocês gostariam que papai ainda tivesse o dinheiro que perdeu quando éramos pequenas? – Perguntou, pois se lembrava de tempos melhores. – Meu Deus! Como seríamos felizes se não tivéssemos tantas preocupações!
– Outro dia, você disse que somos mais felizes do que os filhos dos King, que vivem brigando e se preocupando o tempo todo, a despeito do dinheiro que têm – Beth lembrou-a.
– Eu disse, Beth, e acho que somos realmente mais felizes do que eles. Embora tenhamos de trabalhar, sabemos nos divertir entre nós, somos um “bando alegre”, como diria Jô.
– Jô usa cada termo! – Comentou Amy, olhando com reprovação para a irmã estendida no tapete.
Sentando-se rapidamente  e pondo as mãos nos bolsos do vestido, Jô começou a assobiar.
– Não assobie, Jô! Isso é coisa de homem!
– É por isso que eu gosto!”


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Mulherzinhas
Louisa May Alcott
Romance
Ed. Nova Cultural
edição de 2003